Relações fraternas de irmãos de pessoas com deficiência

Na maioria das vezes, as famílias acreditam erroneamente que os irmãos sem deficiência têm mais recursos para acolher todas as vicissitudes acometidas pela presença de outro filho com deficiência na família. No entanto, tem-se observado na prática que os irmãos precisam do apoio dos pais e dos profissionais.

Vínculo é ligação, é o que une. Os irmãos estabelecem diferentes vínculos entre si.
Segundo alguns autores, destacam-se três condições que favorecem o desenvolvimento do vínculo fraterno: alto grau de acesso entre os irmãos, necessidade de identidade pessoal significativa e insuficiência parental.
Os vínculos serão mais intensos e exercerão maior influência se os irmãos forem muito próximos, tiverem muito acesso entre si e quando, somado a isso, eles tiverem insuficiência no cuidado parental. Nesses casos, os irmãos poderão usar um ao outro como pilar.

Geralmente, os irmãos são deixados de fora na grande maioria do processo das participações de encontros com profissionais, escola, instituições, envolvendo apenas os pais e o irmão com deficiência.
Assim, o papel do irmão sem deficiência fica ao longo do tempo esvaziado de significado, contudo predominam-se as cobranças, responsabilidades futuras e a necessidade quase que imposta da convivência pacífica e compreensiva face à deficiência.
Em muitos casos, não são oferecidas aos irmãos sem deficiência oportunidades para se escutar o que eles pensam, sentem, quais as suas preocupações, quais são as suas necessidades, quais são os obstáculos que enfrentam e quais as suas possibilidades de desenvolvimento pessoal.

Cada irmão é único e singular, e a sua resposta à situação do irmão com deficiência é influenciada por múltiplos factores envolvidos na complexa interacção familiar, por exemplo, pode-se citar: o modo como a família tem respondido às suas necessidades e à do irmão com deficiência; como tem sido a vivência de ter um irmão ou irmãos com deficiência; o tipo e o grau da deficiência do outro irmão; idade dos irmãos; condições de nascimento; o intervalo de idade entre os irmãos; o número de filhos na família; como a família reage emocionalmente e no quotidiano com a situação da deficiência e assim por diante.

Normalmente, os demais filhos sem deficiência encontram pouca tolerância por parte dos pais para expressarem os seus sentimentos negativos, como a hostilidade, a vergonha e o ciúme. É uma grande demanda de energia emocional reprimida que fica circulando no ambiente familiar, mantendo uma fachada de que apenas experimentaram sentimentos positivos em relação ao irmão com deficiência.
Sabe-se que todo esse acúmulo de sentimentos negativos, que não consegue encontrar um caminho de expressão directa, pode expressar-se sob a forma de certos sintomas, tais como perturbações psicossomáticas e comportamentais, pelo que, deste modo, os filhos sem deficiência precisam de uma escuta e continência afectiva para expressarem, compartilharem, entenderem e gerirem a situação e as suas próprias vidas.

Por outro lado, os pais, usualmente, tendem a mostrar dificuldades em exercer a sua autoridade com o filho com deficiência, como colocar limites ou controle. Em contrapartida, com os demais filhos sem deficiência são exigidos padrões mais elevados de comportamento, encontrando-se aí um dos conflitos familiares, pela contestação dos irmãos a uma determinada limitação, demanda e reprovação dos pais, que passam a ignorar ou superproteger o irmão com deficiência.
A ausência de regulação afectiva pode empurrar para que as relações fraternas se tornem defensivas e venham a aparecer comportamentos de: subserviência, superprotecção, permissividade, sobrecarga emocional e de responsabilidades ou podem incrementar uma hostilidade fraterna como a falta de consideração, negligência, desrespeito, agressividade, etc.

O tema da deficiência, por vezes, pode ser instalado no ambiente familiar, como um segredo dos pais. Neste caso, os pais são os únicos que podem gerir as informações e responsabilidades com o filho.
O filho sem deficiência observará a forma como os pais estabelecem o vinculo com o irmão. Logo irá desenvolver fantasias a respeito de que algo está acontecendo ao qual ele não compartilha da verdade. Isso acarretará ao irmão sem deficiência, muita confusão, insegurança, curiosidade, medo, isolamento. Por isso, é importante a família desenvolver um espaço de diálogo com todos.

Em todas as experiências de vida dos irmãos está escondida uma pergunta de dúvida afectiva: se eles são realmente filhos amados por seus pais, ou se há espaço para apenas o irmão com deficiência?
Esta pergunta que não cala vai-se desenvolver de forma diferente dependendo da faixa etária dos filhos, em relação ao irmão com deficiência. Tem-se, assim, caminhos e sentimentos diferentes para cada situação:
- Por volta de 2 a 6 anos os filhos sem deficiência têm a tendência a culpar-se, podem ter fantasias hostis e persecutórias.
- Já por volta dos 7 aos 10 anos os sentimentos envolvem a adaptação à escola, atenção, auto-estima, justiça, participação de jogos/brincadeiras, responsabilidade e sentimentos ambivalentes, são as fases de brigas, conflitos e ajuda.
- Na fase da adolescência e vida adulta, os temas envolvem a sexualidade, namoro, casamento, participação grupal, lazer, rivalidades, transgressão, o projecto de vida e profissão.

Retirado de artigo da psicóloga e pedagoga Marina Almeida (2009)

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