Crianças criminosas

Aos oito anos já traficava droga no seu bairro, assaltava idosos na baixa lisboeta. O pai esteve detido por tráfico de droga e a mãe era prostituta. Andava na rua com os punhos cerrados, como se estivesse sempre pronto para reagir. Outra criança, de 11 anos, de uma família com posses, em situação estável, não consegue estabelecer afectos, trata mal todos os adultos, inclusivamente os familiares. Apontou uma faca à irmã e, quando fez nove anos, fez queixa (ao que tudo indica falsa) dos pais à PSP por maus tratos. Outro jovem de 11 anos pediu a uma criança de quatro anos para "lhe dar beijinhos na pilinha".

São histórias com que os psicólogos, técnicos da segurança social, professores e profissionais ligados ao acompanhamento de jovens conhecem de perto. Há cerca de dez mil jovens internados, entre os primeiros meses de idade e os 21 anos, mas até aos 12 anos as respostas são essencialmente três: centros de emergência, centros de acolhimento temporário e lares de crianças e jovens.
É nestes lares que os jovens manifestam a tendência para o crime ou comportamentos desviantes que são explicados, à luz da investigação científica, por duas vertentes: o contexto social e familiar e a possibilidade (menos explicada e identificada) de perturbações neurológicas.
Os técnicos referem que os factores que levam uma criança à violência e ao crime podem ser muitos, mas nem sempre estão relacionados com a situação social e económica das famílias. Uma técnica disse ao i que há casos de crianças que têm comportamentos desviantes e até cometem crimes, mas a vergonha familiar impede o encaminhamento para as instituições. Num dos casos descritos, dois irmãos com a mesma família, o mesmo ambiente social e a mesma educação, são crianças totalmente diferentes entre si. Uma é estudiosa, com sentido de responsabilidade, afável e participativa. A outra tem graves problemas de comportamento e inserção social. Para a técnica, a total desresponsabilização das crianças cria nelas a ideia de que podem fazer tudo impunemente. A ideia de que a criança nunca tem culpa pode ser perniciosa, acrescenta. A solução, para esta responsável, pode passar pelo reforço dos meios das unidades terapêuticas para que possam articular as comissões de protecção de crianças, escolas, família e outras instituições e fazer um acompanhamento regular.
A técnica refere que os principais crimes identificados são os roubos, o tráfico de droga e os abusos sexuais. Num caso relatado ao i, uma criança de 14 anos foi acusada de abuso sexual de um miúdo de sete anos, pelo que a imputabilidade já era possível - só há lugar a medida de internamento fechado a partir dos 14 anos, mas a a partir dos 12 a conduta pode ser criminalizada -, mas os técnicos vieram a perceber que fora a criança mais nova que o incitou para a prática sexual. Ainda noutro caso, os pais de duas crianças de cinco e seis anos explicaram aos responsáveis da Segurança Social que os filhos viam filmes pornográficos porque era a forma de lhes explicar a sexualidade.
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