Educação de crianças com deficiência intelectual

Atendendo à necessidade do ensino ser encarado numa perspectiva individualizada, por forma a melhor servir as necessidades próprias de cada criança, não se pode afirmar que existam "receitas" específicas para o trabalho com alunos portadores de deficiência intelectual. No entanto, analisando as características gerais comuns a estas crianças, podem ser enunciados alguns princípios educativos a ter em conta durante a programação e implementação desta, junto a estes alunos.

As aprendizagens processam-se de uma forma lenta pelo que é importante focar a atenção apenas nos objetivos que realmente se quer ensinar, criar situações de aprendizagem positivas e significativas, preferencialmente nos ambientes naturais do aluno e de uma forma o mais concreta possível, para que este se sinta motivado e com predisposição para aprender.

Tendo em conta as dificuldades destas crianças em efectuar a aquisição de conceitos abstractos, bem como de generalizar e transferir os comportamentos e aprendizagens adquiridos para novas situações, é necessário que estas aquisições se processem nos contextos e situações o mais variado e naturais possível.

Outro factor a ter em conta é a necessidade de dividir as tarefas em conjuntos de subtarefas mais simples, de forma a graduar a dificuldade das aquisições tornando-a mais acessível e positiva, tendo sempre em mente que o sucesso gera sucesso e o insucesso sucessivo gera desmotivação, recusa de novas aprendizagens e mais insucesso, criando uma baixa auto-estima, logo, uma pessoa infeliz para quem a escola passa a ser um penoso fardo a carregar todos os dias.
Tendo sempre em mente que todas as aprendizagens têm como objectivo principal a facilitação da vida futura numa perspectiva funcional, ou seja permitir uma inclusão e participação activa e válida na vida em sociedade visando, sempre, uma progressiva autonomia do indivíduo, pode-se concluir da necessidade de uma significância eminentemente prática destas aprendizagens.

Assim, relativamente aos alunos com deficiência intelectual ligeira não deverá existir uma grande diferença entre os seus currículos e o dos outros alunos da classe. Deverá ser dada uma grande importância aos comportamentos adaptativos por forma a dotar o aluno com as competências sociais necessárias a um pleno funcionamento e participação na vida em sociedade.

No seu modelo de competência social Sargent (1991) apresenta os resultados desejados, em termos sociais, como fruto de três processos determinados pela cultura dominante:
- O efeito social provocado nos outros (entusiasmo, confiança, optimismo, independência, boa postura, boa apresentação, assertividade);
- As competências sociais (iniciativa para interagir, respostas às interacções, comportamentos sociais pessoais, comportamentos específicos de várias situações, escolares, públicas, familiares, no local de trabalho);
- A cognição social (empatia, discriminação e inferência social, compreensão/ entendimento social, compreensão dos motivos dos outros, julgamentos morais e éticos, resolução de problemas).

Também nas áreas académicas deverá ser sempre tida em conta a necessidade de uma aproximação funcional das aprendizagens. A aprendizagem da leitura e matemática vistas nesta perspectiva deverão dotar os alunos de competências práticas, como por exemplo ler as bulas dos medicamentos, avisos públicos, horários, fazer orçamentos, gestão de dinheiro e situações de compra e venda.

A comunicação oral deverá ser treinada tendo sempre em conta a implementação das competências sociais atrás mencionadas. Há que atender também a questões como a saúde e para os alunos mais velhos o emprego, a sexualidade e as tarefas domésticas.

Em relação aos alunos com deficiência intelectual moderada deverá ser também dada uma ênfase especial aos comportamentos adaptativos, nomeadamente:
- Cuidados pessoais: como se alimentar: saber comer e beber de várias formas e em várias situações utilizando os comportamentos adequados a cada uma destas; vestir-se, despir-se e cuidar do seu vestuário; aplicar os cuidados básicos de higiene.
- Motricidade: controlar a postura em várias situações - sentado, em pé; coordenar movimentos finos - desfolhar livros, enroscar e desenroscar tampas de frascos, riscar ou escrever com um lápis, rodar manípulos de portas; coordenar movimentos amplos - correr, atirar uma bola, trepar, saltar.
- Comunicação: (utilizar as formas mais adequadas para) fazer e responder a pedidos; expressar necessidades e desejos; fazer e responder a perguntas; narrar experiências do dia-a-dia.
- Aspectos académicos: (sempre numa perspectiva funcional) ler e escrever o nome, a morada, o número de telefone; utilizar o telefone; ler informações das paragens de autocarro, comboio; ver as horas; fazer trocos.
- Aspectos sociais: manter comportamentos adequados em várias situações; relacionar-se com os outros, da sua idade e mais velhos; ser capaz de esperar a sua vez em várias situações; seguir regras em jogos;

Para os alunos mais velhos há que atender, ainda, aos cuidados a ter:
- No emprego: chegar a horas, comportamentos adequados enquanto está a trabalhar e a aspectos específicos do emprego; tarefas domésticas.
- Comportamentos na comunidade: saber utilizar transportes públicos; comportamentos socialmente aceitáveis em áreas de lazer, cinemas, teatros, jardins;
- Saúde;
- Sexualidade.

Relativamente aos alunos com deficiência intelectual acentuada, que necessitam apoios mais intensivos, devem ser desenvolvidos os comportamentos básicos de forma a que a criança responda a diferentes estímulos, pessoas, objectos. Deve-se ensinar a prestar atenção, a orientar o corpo e focar o olhar.

Aqui, o desenvolvimento da motricidade desempenha um papel fundamental atendendo às frequentes dificuldades nesta área que estes alunos apresentam, assim como pela importância de que se reveste, seja na locomoção, comunicação ou mesmo na sua vertente lúdica.
Outra área de grande importância é a da estimulação sensorial, táctil, visual e auditiva pelo facto de, mesmo nos casos de alunos com problemáticas mais profundas, permitir uma interação mais positiva entre a criança e o mundo em seu redor.

Não será demais recordar que este tipo de intervenção deverá ser objecto de uma prévia e cuidada programação, os objetivos bem definidos de acordo com as reais necessidades do aluno e a avaliação do programa efectuada de modo a que este possa ser revisto, sempre que tal se justifique. Esta programação e respectiva implementação deveriam ser sempre efectuadas por um conjunto de vários profissionais em colaboração, cada um dentro da sua área, de modo a proporcionar todas as condições de sucesso a estas crianças por forma a poderem dar o seu contributo à sociedade em que vivem.

Fonte: Somatemática

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