Como lidar com a "criança-problema"

Quando pensamos no termo “criança-problema” logo imaginamos, salvo mentalidades livres de preconceitos, numa criança malcriada, agressiva, sem educação, egoísta, dissimulada, e por aí vai. Todos esses adjectivos destrutivos podem realmente ser verdadeiros e o professor pode sentir-se num beco sem saída. Pode parecer sem saída pois esse problema pode contagiar toda a dinâmica de uma turma, a ponto de desviar os objectivos do professor, o qual pode, muitas vezes, perder-se, irritar-se e, portanto, acabar por difundir-se com o problema também. Então, temos uma situação caótica onde o suposto professor torna-se alvo, não da criança-problema mas, o que é pior, do problema em si. Se age inadequadamente tende a agravar o problema e então passa a fazer parte do problema e não da solução. Ao ser alvo do problema, o professor perde a sua função primária, que é de orientar, pois desorientado não podemos orientar.
Nesse momento, ou até anterior a esse, é importante pensarmos que o problema que a criança apresenta é um sintoma. Como analogia, pensemos num corpo febril. E para começarmos a desatar o nó, pensemos: problema = sintoma.
Ao sentirmos febre, sabemos que algo não está saudável no nosso organismo, mas ainda não sabemos o que é, ou seja, ainda não sabemos nomear o que a febre anuncia.
Pode ser dor de garganta, de ouvidos, infecções das mais variadas, gripe, até doenças mais graves.
O que fazemos então, diante da febre?

Primeiro passo - oferecemos ao "ser febril" um "antipirético".
Existem várias formas de apartarmos uma "febre". Quando a criança, por exemplo, apresenta o seguinte sintoma: o Joãozinho sempre rouba o material dos colegas, causando alvoroço e tensão na sala de aula, pois, além disso, ele ameaça que quem o acusar será “apanhado na saída”.
O professor, então, convida o Joãozinho para uma conversa a SÓS. NÃO ADIANTA REPRESÁLIAS EM PÚBLICO, POIS AO INVÉS DE TRAZER REFLEXÃO, TRAZ SENSAÇÃO DE HUMILHAÇÃO E CONSEQUENTE REVOLTA.
Convidar a criança a retirar-se com o professor, ou interrromper uma briga e conversar a sós com ela, é um bom "antipirético". No caso de o professor não poder ausentar-se da sala, será melhor que ele aparte o conflito e avise que mais tarde haverá uma conversa para que possam, juntos, entender o que se passa.
É importante que o professor chegue perto dessa criança, dessa anormalidade que ela apresenta e que desequilibra todo um grupo.
O professor que se disponibiliza para a criança, mostrando-lhe que estará junto dela para compreender o que se passa pode, no momento em que se oferece, receber muito mais abertura do que imagina, ou não. É claro que existem casos difíceis onde a criança parece estar trancada dentro de si mesma, porém, se o sintoma existe é porque algo nessa criança pede para ser visto.
O facto da criança poder desequilibrar um grupo todo já nos leva a pensar que ela tem, no mínimo, um grande potencial, mesmo que este esteja a ser revelado de forma destruidora.
Voltando à nossa analogia: quando a "febre" está demasiado elevada, para combater a temperatura excessiva, oferecemos o "antipirético" e iniciamos nossa investigação.

Segundo passo - investigamos a causa da febre.
As inúmeras formas de se investigar a causa do sintoma de uma criança, é proporcional aos inúmeros modos de ser dos professores.
Cada professor tem o seu modo de ser e sabe trabalhar de determinada forma com seus educandos, por isso, pense na sua forma própria e tente apenas adaptá-la às formas que abordamos neste texto.
Primeiramente, é importante perguntarmos à criança se ela sabe por que está agindo de determinada maneira ou se ela precisa de ajuda para descobrir o que está a acontecer.
Então, primeiro, devemos consciencializar a criança da situação que ela causa e comprometermo-nos a ajudá-la nessa descoberta.
No exemplo de Joãozinho poderá o professor oferecer-se para pensar com o miúdo do porquê ele rouba as coisas dos colegas, como ele se sente ao agir assim.
É interessante pensar que ditar regras e “lições de moral” não bastam para a criança modificar seu comportamento. O que leva a modificar um comportamento de forma eficaz, é a REFLEXÃO sobre si mesmo.
Então, a investigação da causa do sintoma dá-se através da instigação sobre a própria criança. Isso acontece de duas formas:
- Tentando descobrir como ela se sentia antes do comportamento inadequado e como se sentiu durante e depois. Quando ajudamos a criança a dar nomes aos seus sentimentos, estamos automaticamente a ensiná-la a lidar com eles de maneira mais controlada. Muitas vezes as crianças não sabem bem por que agem de determinada forma, é preciso ajudá-las a comprenderem-se.
- Fazendo-a colocar-se no lugar da vítima. Isso também é importante. A criança precisa entender: “magoou o Zézinho...o Carlinhos tá triste porque ficou sem o lápis...”.

Terceiro passo - nesse momento já chegámos perto da criança, mostrámo-nos interessados pelo que ela nos apresenta, então, podemos ter uma ideia ou mesmo ter diagnosticado o sentido do sintoma.
Dependendo do que esteja provocando a "febre", será a nossa intervenção. Se for algo grave, pediremos auxílio de outros profissionais, como psicólogos, terapeutas da fala, oftalmologistas, etc.
Muitas vezes, infelizmente não sempre, descobre-se que a criança necessitava mesmo era de um diálogo que a situasse na própria existência.
Cada caso é um caso, o importante é o professor mostrar-se disponível para ouvir o que a “febre” nos acusa. O professor deve ser capaz de colocar-se no lugar da criança-problema, e de tranquiliza-la oferecendo comportamentos adequados.

Comentários

  1. Vale a pena espreitar, nomeadamente se se trabalha na área:

    CRTIC

    Ed Especial-JA

    Votos de 1 bom ano!

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